domingo, 5 de setembro de 2010

quebra de discrições

Levi Nauter



Aqui em casa, filha, a gente sempre procurou manter discrição em tudo. Desde quando morávamos em outro lugar, víamos vizinhos gritando, brigando, xingando-se. Alguns dos nossos familiares ainda possuem essa 'tradição'. Sempre pensamos que conosco, na nossa família, haveria de ser diferente. E temos conseguido. Afinal, ninguém precisa saber dos nossos problemas; ninguém tem o direito de, ao longe, assistir-nos de camarote sem se importar com as nossas humanidades.
A tal discussão também se estende àquilo que tornamos público. A quem interessa nossas pequenas realizações? O que se acrescenta na vida dos que passam a saber o tamanho da nossa casa? O que muda na vida de quem propagandeia ter adquirido um note ou um netbook, um carro, um iPod ou tantas outras bugigangas de utilidade relativa? As nossas conquistas interessam sobremaneira a nós três, eu, mamãe e você. A mais ninguém. Talvez uma pequena concessão se faria aos demais familiares, e ainda a umas poucas amizades. Isso para mim é discrição, em suma.
Poderíamos, ainda, resumir a discrição de que falo como sendo ‘chegar, fazer o que precisa ser feito e sair sem ser notado’.
A tua chegada mudou um pouco isso em nós. É bem legal notar o quanto uma criança quebra paradigmas, algumas crenças, algumas manias.  A primeira quebra de discrição é esse blog. Aqui conto praticamente tudo que vem acontecendo desde que nasceste (e estou preparando um conjunto de textos escritos antes da tua chegada). Outra coisa que mudou foi ter de cuidar-te por vezes às pressas. Uma vez tivemos de trocas tuas fraldas num fraldário todo de vidro. Até aí tudo bem, mas a mamães sozinha não dava conta de tanto cocô; tive que ajudar: um erguia tuas perninhas, o outro pegava lenços umedecidos (vários) e ia limpando. Enquanto isso, choravas inconsolável. Várias pessoas passavam por aquele centro comercial, umas riam e admiravam a tua beleza, enquanto outros provavelmente riam do desajeitado pai limpando cocô.
brincando com um amiguinho feito na hora
Quando estavas descobrindo a voz foi outro momento. Às vezes íamos a uma consulta, todos estavam quietos com seus pais. De repente soltavas um grito e lá ia o pai ou mãe caminhar e como que a te dizer no ouvido: fala mais baixinho, filha. Tudo em vão.
querendo levar todas as bolsas
Mas agora a coisa se alastrou. Afinal, já caminhas, já falas umas poucas palavras e, sobretudo, já sabes subir em cadeiras e sofás com a maior facilidade. Já queres brincar de se esconder e de pega-pega. Qualquer loja torna-se pra ti um centro de lazer. As fotos comprovam que ficas a coisa mais linda do mundo. Mas dá um trabalho...
Assim é que perdemos um pouco da vergonha. Dizemos a nós mesmos: ela é uma criança e precisa justamente desse espaço para ser a criança que é.
E que criança linda.
Nós te amamos.
 

querendo se esconder da mamãe
























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